Seção local da Associação de Geógrafos na região do ABC Paulista

Confira o resumo da mesa do 1º Encontro de Professores de Geografia no ABC

Aconteceu no dia 01/06 o 1º Encontro de Professores de Geografia no ABC, denominado “Pré-Fala Professor”, pois serve de preparação para o encontro nacional de mesmo nome. A atividade foi sediada na Subsede da APEOSP Santo André e contou com presença de professores e estudantes da Fundação Santo André, da USP e de professores das redes municipal e estadual de ensino. Compuseram a mesa como palestrantes a doutora em Educação Ana Paula de Oliveira Corti, a mestre em Educação Isabel Rodrigues e graduando em Geografia e orientador socioeducativo Wanderson Luis. Apresentamos a segue um resumo (com imperfeições e simplificações) das valorosas exposições.

Ana Paula Corti destacou a centralidade das políticas curriculares na vida escolar brasileira, enquanto política educacional, os exemplos mais atuais são os intensos debates e preocupações acerca da BNCC e da Reforma do Ensino Médio.
A doutora em educação apresentou um breve histórico das políticas educacionais neoliberais e como elas importam a lógica industrial taylorista para a gestão das unidades escolares e para dentro da sala de aula. O apartar entre o planejar e executar, mecanismo de alienação do trabalho operário, foi levado das Indústrias para as escolas e o professor torna-se operário de uma educação já planejada e padronizada, independente do contexto daquela realidade escolar. A lógica é de introduzir insumos em uma ponta para produzir resultados padronizados.

Do ponto de vista hegemônico o currículo significa controlar mais e melhor o processo da produção educacional, sendo que no Brasil o aprofundamento dessas concepções se deu nos anos 90. O objetivo do Estado neoliberal é controlar mais, investido menos. Para tanto nasce em 1995 o SAEB e em 1998 o ENEM, os PCNs e o FUNDEF, que para receber verbas organizou a educação a partir dos ditames do Banco Mundial. Nesse período, o MEC e Secretaria Estadual de Educação de São Paulo eram compostos pelos mesmos grupos políticos, sendo que em SP a mecanização e padronização foi radicalizada com o programa “São Paulo Faz Escola”, as cartilhas e o SARESP. A possibilidade da continuidade dessas políticas educacionais não pode ser explicada pelos sucessos de ensino-aprendizagem, pois nesse quesito foram um fracasso, mas sim pelo autoritarismo característico do neoliberalismo, já que a deliberação coletiva e a democratização atrapalha a eficiência da gestão dos negócios, prioridade liberal. Exemplo são os conselhos de escola e PPPs coletivos fragilizados.

Cotri chama atenção para o fato de que o governo federal atual é ultraliberal e ultramoralista e que as propostas apresentadas de ensino EAD e homeschooling servem para criminalização do professor e para um projeto de acabar com ensino como conhecemos, numa construção de discurso ideológico para educação, independente da viabilidade real das propostas.

As ocupações estudantis de 2015 que aconteceram sem ninguém prever foram consideradas uma explosão da essência da educação. É necessário estudar, se organizar e reinventar para defender a escola e criar novos levantes dessa essência.

Isabel Rodrigues iniciou sua exposição conclamando a defesa da democracia interna na Fundação Santo André, importante centro universitário do ABC.
Utilizando-se da transcrição de um vídeo de um professor demitido de uma escola particular, levantou como a riqueza de conteúdos presentes na fala, como a democracia, a problemática da exclusão de minorias, entre outros, ficou eclipsada pelo debate moral sobre a forma da fala do professor e a tendência atual de criminalização dos professores. Tendência que está ancorada, segundo fala citada de Jandira Uehara da CUT, na possibilidade de não acumulação dos ricos a partir da crise de 2008. Ou seja, o discurso de beligerância contra os mais pobres num momento de crise chega aos professores também por estarem tão próximos dessas vidas que se pretende desvalorizar.

Portanto, o tema do Fala Professor “A prática do(a) professor(a) à margem: resistências, saberes e poderes” é preciso para o momento e deve levar a uma profunda reflexão sobre qual olhar e as práticas dos professores na escola: O quanto elas se aproximam do currículo biófilo de Paulo Freire, o quanto elas são uma resistência a educação empresarial, bancária e ao controle dos corpos e do espaço, o quanto substituem a competitividade e o corporativismo pela cooperação, dando espaço para a diversidade, considerando os indivíduos. Isabel citou como exemplo vivido com inclusão de fato de dezenas de alunos com deficiência em uma escola paulista com organização baseada na escola da ponte.

Rodrigues finalizou expondo o entrelaçamento das propostas atuais para a educação, como a BNCC, com instituições financeiras e o pensamento político conservador.

Wanderson Luis iniciou sua fala elencando medidas dos governos do PT que aumentaram o acesso de estudantes negrose pobres às universidades. Destacou que mesmo políticas que já existiam foram ampliadas, como a nacionalização do ENEM, antes limitado regionalmente. Contudo, o SISU, as cotas e a construção de novas universidades públicas não foram suficientes para a permanência dos recém-ingressos. A falta de moradia estudantil e os horários impraticáveis para estudantes trabalhadores foram a pontados como algumas das causas para a dificuldade de permanência, soma-se aos problemas concretos a falta de preparação das universidades para esse público periférico, pois outros públicos possuem outros anseios e requerem outros olhares, muitas vezes não incluídos na percepção de mundo da academia.

“Sessenta por cento dos jovens de periferia sem antecedentes criminais
Já sofreram violência policial
A cada quatro pessoas mortas pela polícia, três são negras
Nas universidades brasileiras
Apenas dois por cento dos alunos são negros
A cada quatro horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo”

A introdução da música “Capitulo 3, Versículo 4” dos Racionais Mcs, lançada em 1997, foi utilizada por Wanderson para a reflexão sobre o alcance das políticas educacionais do último período. Comparando-os com números atuais do INEP e de outras fontes revelou que se houve uma melhora a ser considerada, permanece uma enorme desigualdade racial no acesso à ciência e tecnologia. E que com o atual governo a tendência é de desmonte desses poucos avanços.

Ponderou ainda que o atraso da esquerda no campo das comunicações e a falta de capilaridade das organizações na vida do povo permitiram o avanço da direita. E que mesmo nos espaços da esquerda persistem vícios e reproduções das desigualdades, como poucas oportunidades para o debate da questão racial. A superação virá da luta, por exemplo, para colocar na prática cotidiana a Lei 10.639/03 (estabelece a obrigatoriedade do ensino de história da África e das culturas africana e afro-brasileira no currículo da educação básica). E do uso da Geografia e das ciências humanas para compreensão do mundo e do lugar de cada um nele.

Após as exposições da mesa, seguiu-se um rico debate com os participantes da atividade.

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